A cultura reinventando a cidade

Simone Armorin

Investigadora e gestora cultural, PhD em Políticas Públicas (UERJ), MSc em História, Política e Cultura (CPDOC/FGV-Rio), possui MBA em Gestão Internacional de Políticas Culturais (Universitat Girona). É investigadora integrada no Centro de Estudos sobre África e Desenvolvimento, da Universidade de Lisboa. Possui experiência de mais de uma década em gestão e planejamento de políticas culturais

As cidades são, por excelência, o espaço onde a cultura se manifesta e as instituições culturais um amálgama dos valores compartilhados por determinada sociedade num tempo histórico dado.

Introdução

O aprofundamento das desigualdades sociais, cuja extensão ainda não se pode calcular totalmente, é um dos legados perversos da pandemia que assolou o mundo a partir de 2020. Inclusive, pelos efeitos multi-factoriais, que podem levar décadas até serem completamente superados, pelas populações de todo o mundo. Afora aquelas perdas que jamais poderão ser superadas, como é o caso dos milhões de vidas perdidas em virtude de um mal perfeitamente expectável no contexto socioambiental de degradação dos ecossistemas terrestres em que se vive hoje. Um paradoxo constrangedor frente à nossa capacidade de mitigar esses danos a partir de uma outra política de convivência neste planeta.

No plano econômico, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que a pandemia causou o equivalente a 305 milhões de perdas de empregos [1]. Dados do Eurostat [2] demonstram que no nível da UE, o déficit público e a dívida pública em relação ao PIB foram maiores em comparação com os seus rácios pré-pandemia, conotando o esforço dos países na elaboração de uma resposta urgente ao sistemático desmonte do estado de bem-estar social.

Dados da ONU [3] apontam ainda que a taxa global de extrema pobreza aumentou pela primeira vez desde 1998, de 8,4% em 2019 para 9,5% em 2020, um adicional de 101 milhões de crianças e jovens ficaram abaixo do nível mínimo de proficiência em leitura, apagando os ganhos educacionais alcançados nas últimas duas décadas. Os dados denotam ainda que se, por um lado, os mais pobres e a classe média vivem escassez de recursos, por outro, os mais ricos ficaram mais ricos. A desigualdade crescente atinge níveis brutais em todo o planeta.

A pandemia expôs e intensificou as desigualdades dentro e entre os países. Se é certo que a Covid-19 não foi seletiva em termos de contágio, é igualmente correta a ideia deque os efeitos de sua presença foram sentidos de forma diferente nas diferentes latitudes do planeta e, inclusive para conjuntos diferentes de indivíduos que habitam um mesmo país ou cidade. Não estivemos todos na mesma pandemia. Para aqueles cuja situação crítica é um fenômeno presente no dia a dia, há décadas, a pandemia foi fatal, para outros a crise se restringiu à esfera da saúde pública, enquanto uns pouquíssimos conseguiram lucrar com a situação.

A conjuntura de crise vivenciada globalmente nos últimos dois anos e que ainda se faz presente em muitas realidades, sobretudo no sul global [4] – sensivelmente no sul global presente no interior de alguns países do norte, é uma realidade ainda escassamente examinada. Por mais que esses dados devam ser escrutinados, inclusive na componente histórica que lastreia a nossa chegada a esse ponto da situação, este artigo não se deterá nela. Amplamente documentada, a conjuntura “pós-crise” é apenas cenografia das ideias aqui apresentadas, pois aporta elementos que nos permitirão imaginar modelos de construção de outros cenários, outras inflexões criativas a propósito do desenvolvimento.

A cultura foi crucial no período mais intenso da crise recente e poderá ser ainda mais importante na estratégia de superação dos seus efeitos nefastos no campo social e na projeção do que entendemos por desenvolvimento para os próximos anos. No momento em que as pessoas se viram obrigadas ao confinamento, favorecidas pelos avanços nas tecnologias de comunicação e informação, elas voltaram-se aos bens culturais da literatura, das produções audiovisuais, da música. Novíssimas dramaturgias mediadas pelo computador possibilitaram ir ao teatro sem sair de casa, participar de um festivaldesde dentro de cada quarto ou visitar uma exposição num museu de outro continente, ali, na ausência dos telões, nas telinhas ou telas de cada aparelho pessoal. Quando já não era possível o contacto físico, esses bens de cultura alargaram ainda mais o alcance das nossas possibilidades de fruição cultural.

ACEP

Existe um enorme potencial das instituições culturais contribuírem efetivamente no processo de coesão social, tão necessário no momento em que o mundo organiza a recuperação de uma crise em escala mundial.

Se por um lado um infinito de possibilidades foi testado e amplamente acolhido por parcelas das populações de todo o mundo, ficou patente no período o ínfimo número das pessoas que puderam contornar a situação adotando esses novos modelos: aqueles com acesso a internet, aqueles com letramento digital e cultural mínimos que lhes permitisse adaptarem-se a esses novos formatos. Aqueles que antecipadamente já tinham algum tipo de vivência no ambiente da cultura de uma determinada sociedade.
No contexto em que este texto foi produzido, no rescaldo de uma crise pandêmica que contingenciou a participação das audiências culturais; uma cidade, com população estimada de 230 mil habitantes [5], no norte de um país com não mais de 11 milhões de residentes prepara-se para abrir as portas de um novo equipamento cultural, público, que “aposta na inclusão social e cultural através do acesso ao cinema, passando pela educação, mas também pela criação de comunidades de cinefilia junto a diferentes grupos de diferentes identidades, demografias e culturas” [6]. Motivo de alguma expectativa de que o planejamento de uma política estruturada de desenvolvimento a partir da cultura podem sinalizar avanços. De acordo com notícia divulgada nos canais da empresa municipal de cultura do Porto, Ágora Cultura e Desporto, o ‘Batalha Centro de Cinema é o novo centro cultural da cidade do Porto que tem como missão promover o conhecimento e a fruição cultural através do cinema e da imagem em movimento. Arrendado pela Câmara do Porto por um período de 25 anos, vai ser devolvido à cidade mais de uma década após o seu encerramento, retomando a sua função cultural centrada no cinema’ [7].
A cidade Porto tem investido estruturadamente na oferta de uma programação cultural diversificada, acessível e que valoriza tanto os equipamentos culturais históricos,quanto a convivência em novos espaços e a experimentação na cidade. À semelhança do que aconteceu com parte significativa das instituições desse setor no mundo, as daqui foram igualmente impactadas pelos confinamentos e demais efeitos da pandemia. Impactos reverberados pesadamente nos profissionais da cultura e não só artistas – segmentos historicamente precarizados. Nesse momento, nota-se uma retomada gradual do planejamento iniciado em 2019, quando incorporou o campo da cultura na empresa municipal criada para dar dinamismo às ações de desporto e entretenimento.
Neste momento em que se busca planificar a recuperação pós-pandemia, este texto propõe, tal como o exemplo mencionado acima, um resgate ao entendimento da cultura como um recurso na cidade. Um elemento importante no quadro de proposições para um modelo mais justo para as pessoas em seus territórios. Uma forma de pensar os espaços como potência e as pessoas como sujeitos da transformação que precisaremos construir mediante o cenário devastado pela crise. Neste sentido, resgatamos a ideia de Celso Furtado [8], no seu discurso de posse no Ministério da Cultura do Brasil, em 1986, para quem “o essencial da cultura reside em que ela é a resposta aos problemas permanentes do homem” (Furtado, 2012).
O artigo estrutura-se em três dimensões: no resgate da noção de desenvolvimento a partir da cultura, e neste sentido cabe um esforço de caracterização das ideias sobre desenvolvimento – para Furtado o desenvolvimento deveria ser pensado como um processo global de transformação da sociedade não só em relação aos meios, mas também aos fins (Furtado, 2000); no entendimento das dinâmicas de culturalização do espaço da cidade como uma possível estratégia de democratização dos territórios, para além daquelas restritas ao consumo, mas um ambiente onde é possível entender a democracia como valor. Por fim, esboçamos algumas reflexões esperançosas à volta da ideia de cultura como um recurso, no âmbito das cidades, ao serviço do modelo que podemos desenhar para a proposta de superação das desigualdades sociais em curso.

Desenvolvimento e cultura

Para idear o futuro que gostaríamos de projetar num cenário de superação das desigualdades sociais presentes nas sociedades atuais, antes é necessário retomar o exercício de imaginar a que fins servem determinadas estratégias, do contrário corre-se o risco de cristalizar a ideia de um “novo normal” resiliente que escamoteia a possibilidade real de desenvolvermos formas mais solidárias de vida para todos. O desenvolvimento, um conceito em disputa, haja vista a sua componente eminentemente política, em primeiro lugar deve ser para todos. Uma estratégia que pretenda contribuir genuinamente para o desenvolvimento de uma sociedade não pode deixar de fora alguns dos seus indivíduos, sob pena de nunca se consolidar como efetiva. Nas palavras de Celso Furtado:

Toda autêntica política de desenvolvimento retira a sua força de um conjunto de juízos de valor nos quais estão amalgamados os ideais de uma coletividade. E se uma coletividade não dispõe de órgãos políticos capacitados para interpretar suas legítimas aspirações, não está aparelhada para empreender as tarefas do desenvolvimento. (Furtado, 1974:42)

Furtado, um economista reconhecido internacionalmente pelos contributos à reflexão sobre o subdesenvolvimento e seus aportes à teoria económica do desenvolvimento, não tardou em perceber o papel da cultura e da criatividade no estabelecimento daquilo que poderia ser o elemento de coesão do esforço político empreendido por uma sociedade no sentido de avançar na melhoria das condições de vida das pessoas. Como tal, defendeu que:

[…] o conceito de desenvolvimento, que se relaciona com grau de satisfação das necessidades básicas humanas elementares [requer] a referência a um sistema de valores, pois a ideia mesma de necessidade, quando não se trata do essencial, perde nitidez fora de certo contexto cultural. (Furtado, 1980:16)

Para ele, pensar o desenvolvimento requer um exercício de imaginação que passa necessariamente pelas estratégias empreendidas nas políticas culturais. Defendia que o elemento de utopia de que necessitamos somente poderia vir da política cultural (Furtado, 2012). No âmbito dessas ideias estava claro o papel da cultura na invenção da superação das desigualdades impostas por uma condição de subdesenvolvimento:

Como duvidar de que é nesse setor que se apresenta o maior desafio na caminhada para um autêntico processo de desenvolvimento, para a convergência do processo de crescimento econômico com o aperfeiçoamento das formas de convivência social e a abertura de novos espaços à realização das aspirações tanto materiais como espirituais de toda a cidadania? (Idem:106)

O elemento cultural, de acordo com essas ideias, é que dá sentido à noção de desenvolvimento
e não o contrário. A cultura é a gramática de valores praticada por determinada sociedade e compartilhada entre os seus membros. Sem esse exercício coletivo é impossível imaginar a superação das desigualdades ou projetar o futuro.

 

ACEP

Não se concebe um esforço de construção de melhores condições de vida para as pessoas sem o envolvimento efetivo de todos no compartilhamento de um sistema de referências impregnado de presente.

A culturalização do espaço da cidade

As cidades são, por excelência, o espaço onde a cultura se manifesta e as instituições culturais um amálgama dos valores compartilhados por determinada sociedade num tempo histórico dado. A cultura passou por inúmeras transformações no tocante à sua função social, isto é, ao papel que ocupa na vida das pessoas e na forma de organização das cidades. Estamos experimentando neste momento pontos de viragem no que se refere a um fenómeno cada vez mais intenso de culturalização da experiência coletiva. O século XXI aporta um elemento novo nesse conjunto de ideias que é a condição real das periferias – simbólicas ou concretas – participarem da vida cultural da cidade. O alargamento da função social da cultura trouxe a possibilidade de inclusão de novos atores na
cena pública da experiência simbólica. Essa participação pode se dar na forma do ressentimento imposto pelas políticas de exclusão – o argumento da distinção, que classifica e categoriza cada expressão da cultura legando para cada qual o seu lugar – ou pelo entendimento das culturas como potência.

A democracia cultural é elemento estratégico da visão de determinada sociedade sobre o seu desenvolvimento. De acordo com Heloisa Buarque de Hollanda:

Foi aos poucos que, nas décadas finais do século XX, começamos a assistir, inseguros, ao advento de uma onda gigante: um processo radical de desestabilização das grandes narrativas e dos grandes divisores culturais da modernidade. O advento de um fenômeno batizado pelos teóricos da cultura como a culturalização do espaço da cidade. Ou seja, a propagação e hibridização das formas culturais na nova densidade da textura urbana. Os museus se repensam, as cidades se tornam grandes museus históricos, a cultura de massa se sofistica, a de elite procura novas estratégias para acelerar o acesso e a democratização de seu consumo. A chamada cultura popular começa a ser atraída para novos mercados e demandas nacionais e internacionais (Hollanda, 2012:17).

É nesse sentido crucial o investimento de recursos e estruturas das administrações pública e privada no desenvolvimento de pontes: geográficas, geracionais, interlinguagens, a subversão do espaço do canónico e do popular, o uso do espaço da rua e a rua enquanto liberdade de expressão dentro do espaço dos equipamentos culturais consolidados etc. A cidade vivida como laboratório da cultura, onde cada espaço funciona como um locus de experimentação cultural pelos muitos agentes da sociedade. Essa perspectiva só se consolida num ambiente que entende a cultura no plural: as culturas. O século XXI consolida o fim de uma era onde um curador programa a experiência coletiva com o simbólico. Esse tempo não existe mais, o que existe é um espaço de diálogo entre as muitas experiências culturais amealhadas individual e coletivamente na miríade de possibilidades pulsantes nas cidades, entre o indivíduo, as instituições culturais, os ambientes virtuais e as trocas em nível global possibilitadas pelas tecnologias, na atualidade.

A cultura como um recurso da cidade

Existe um enorme potencial das instituições culturais contribuírem efetivamente no processo de coesão social, tão necessário no momento em que o mundo organiza a recuperação de uma crise em escala mundial. Furtado faz uma ressalva importante ao alertar que:

O essencial da cultura reside em que ela é a resposta aos problemas permanentes do homem. E, neste sentido, o mais importante para nós, que pensamos em cultura, é a capacidade criativa do homem. É aqui que está a ligação com o presente, com a luta pela democratização do país, pelo direito de participar na invenção do próprio futuro. (Furtado, 2012:38)

A tarefa de invenção do futuro requer pensar a cultura como ‘organização dos significados e dos valores de um determinado grupo social e como um campo de luta onde eles possam ser modificados em direção a um mundo mais democrático’ (Cevasco, 2003). Não se concebe um esforço de construção de melhores condições de vida para as pessoas sem o envolvimento efetivo de todos no compartilhamento de um sistema de referências impregnado de presente. Trata-se da razão cosmopolita a que referia Santos (2006), como um modelo invertido de racionalidade, no sentido de conter o desperdício da riqueza social do tempo presente:

[…] expandir o presente e contrair o futuro. Só assim será possível criar o espaço-tempo necessário para conhecer e valorizar a inesgotável experiência social que está em curso no mundo de hoje. Por outras palavras, só assim será possível evitar o gigantesco desperdício da experiência de que sofremos hoje em dia. Para expandir o presente, proponho uma sociologia das ausências; para contrair o futuro, uma sociologia das emergências. […] a imensa diversidade de experiências sociais revelada por estes processos não pode ser explicada adequadamente por uma teoria geral, proponho o trabalho de tradução, um procedimento capaz de criar uma inteligibilidade mútua entre experiências possíveis e disponíveis sem destruir a sua identidade. (santos, 2006:779)

A cidade é o espaço privilegiado das experiências possíveis da coletividade e a cultura, o recurso mais valioso na sua concretização. Entender a cultura como recurso na cidade é entender a cultura na sua tridimensionalidade. É conceber a sua potencialidade económica, enquanto geradora de recursos para aqueles que nela se engajam; a sua eficácia simbólica, pela capacidade de realizar o ideal humano que nos distingue das outras espécies vivas, pela capacidade imaginativa e criadora e; muito especificamente, enquanto dimensão cidadã, na medida em que questiona se há avanço quando os direitos não englobam parcelas alargadas da sociedade. Não existe cidadania plena se ela não é universal, porque enquanto todos não puderem compartilhar de condições de sobrevivência humana digna, minimamente aceitáveis, um indivíduo, embora representativo de um modelo, falha na substância do que esse modelo pode realizar. Não existe democracia cultural pela metade sem a participação – não necessariamente homogénea – de todos.

ACEP

Repensar as cidades como espaço de criação de um novo modelo, diferente daquele que vinha sendo praticado antes da crise pandêmica, (…) agora centrado nas pessoas e nas possibilidades destas projetarem um futuro melhor para as gerações que as sucederão, (…) é, assim, também um papel central da estratégia cultural das nossas instituições.

Considerações finais

Esse texto é uma tentativa de suscitar o debate em torno da modelagem pública da estratégia cultural na cidade. São volumosos os investimentos mobilizados em todo o mundo e que, tendo a cultura como o parâmetro central do desenvolvimento, não passam de ecos vazios de um projeto de mercantilização do espaço de sociabilidade das pessoas. Não raro, comodificação dos territórios e transformação das experiências de interação dos sujeitos em mercadorias a serem consumidas. Esse modelo, uma realidade difundida nos projetos de revitalização urbana surgidos um pouco por toda a parte desde a década de 1990, tem imposto às instituições culturais uma responsabilidade redobrada no seu papel de indutoras do desenvolvimento.

Portugal tem um enorme desafio pela frente no tocante às estratégias que lançará mão para enfrentamento de um período em que especialistas em políticas sociais do mundo todo identificam como desafiador a curto e médio prazos, no contexto pós-pandemia. Incerto no tocante à disponibilidade mundial de recursos que possam fazer frente à escassez provocada pelas recentes políticas de austeridade que esvaziaram o estado de bem-estar social, imaginar o futuro, reinventar políticas de convivência, criar espaços de reflexão coletiva e de criação de cenários possíveis requererá das nossas instituições culturais um esforço adicional nesse momento.

A cultura como fator de desenvolvimento, enquanto estratégia combinada de um conjunto de modelos desenhados para contribuir com a redução das disparidades sociais e promover a qualidade de vida dos cidadãos de determinado território traz em si uma potência e um grande desafio. Trata-se de um investimento cujos frutos não são imediatamente perceptíveis, mas que historicamente contribuem para pôr em evidência os elementos mais promissores para a transformação social.

Repensar as cidades como espaço de criação de um novo modelo, diferente daquele que vinha sendo praticado antes da crise pandêmica que assolou o mundo em 2022, agora centrado nas pessoas e nas possibilidades destas projetarem um futuro melhor para as gerações que as sucederão, mais digno e mais humano é, assim, também um papel central da estratégia cultural das nossas instituições e uma possibilidade de que a virada cultural das cidades, de fato, se concretize.

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[1] ILO Sectoral Brief – The impact of COVID-19 on the tourism sector. May, 2020. Disponível em: https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/—ed_dialogue/—sector/documents/briefingnote/wcms_741468.pdf: Acesso em 10/09/2022.

[2] Eurostat – European Statistical Recovery Dashboard. August, 2022. Disponível em: https://ec.europa.eu/eurostat/cache/recovery-dashboard/. Acesso em 10/09/2022.

[3] ONU – Relatório de Metas de Desenvolvimento Sustentável 2021. Disponível em: https://dssbr.ensp.fiocruz.br/wp-content/uploads/2021/08/The-Sustainable-Development-Goals-Report-2021.pdf. Acesso em 10/09/2022

[4] O conceito de sul global empregado neste texto relaciona-se com as ideias desenvolvidas no contexto dos pensadores do grupo denominado Modernidade/Colonialidade, no qual se inscreve o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos (2010), para quem as epistemologias emergem do sul epistêmico e não de um sul território, impondo-nos a revisitar a história moderna ocidental na instituição dos marcadores fronteiriços da diferenciação que institui a produção dos nossos saberes, compreendido enquanto um pensamento abissal. Esses marcadores, enquanto “distinções dos visíveis e invisíveis”, caracteriza uma corrente de pensamento abissal marcada enquanto um sistema de distinções em que os visíveis fundamentam os invisíveis. Para ele, “as distinções invisíveis são estabelecidas através de linhas radicais que dividem a realidade social e dois universos distintos: o universo ‘deste lado da linha’ e o universo ‘do outro lado da linha”. A construção da realidade entre visíveis e invisíveis consiste numa criação de uma verdade sobre o outro/nos, entre os que são reconhecidos e os que não são reconhecidos, que consiste numa divisão do não reconhecimento daqueles que estão inseridos do “‘outro lado da linha’ desaparece enquanto realidade, torna-se inexistente”, numa forma exclusão e inexistência radical de indivíduos (Silva, 2022).

[5] Dados do INE – Instituto Nacional de Estatísticas, relativos a 2021.

[6] Programação do Batalha Centro de Cinema é revelada a 28 de setembro. Disponível em: https://www.porto.pt/pt/noticia/programacao-do-batalha-centro-de-cinema-e-revelada-a-28-de-setembro?fbclid=IwAR2vVTGM1knsqSHoeLfiMsU9h6TFa8QASWbtdqKSeL1yDb3xoD-oWIXzwfc, acessado em 20/09/2022

[7] Idem

[8] Cujo centenário de nascimento assinalou-se em plena pandemia, em julho de 2020, o que ofuscou parte das celebrações programadas pelas universidades e pelo próprio Centro Celso Furtado, no Brasil.

 

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Referências

Cevasco, M.E. (2003) Dez lições sobre estudos culturais. Boitempo.

Furtado, C. (1974) O mito do desenvolvimento. 2.ed. Círculo do Livro.

Furtado, C. (1980) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. Companhia Editora Nacional.

Furtado, R.F. (Org) (2012) Ensaios sobre a cultura e o Ministério da Cultura. Contraponto.

Hollanda, H.B. (2012) A cultura como recurso. Secretaria de Cultura do estado da Bahia. Fundação Pedro Calmon.

Santos, B.S. (2006) (Org) Conhecimento prudente para uma vida decente: um discurso sobre as ciências revisitado. Cortez.

Santos, B.S. (2010) Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. In: Santos, B.S.; Meneses, M. P. Epistemologias do Sul. Cortez

Silva, R. (2022) Decolonialidade do saber: as ecologias dos saberes na produção do conhecimento. Revista Katálysis. 2022, v. 25, n. 2, pp. 356-364. https://doi.org/10.1590/1982-0259.2022.e84178.