Fakebook.eco: desmascarar e combater a desinformação ambiental no brasil é um dever moral

Ana Filipa Oliveira

Trabalha na ACEP desde 2009, onde desenvolve projectos na área da comunicação, advocacia e direitos humanos. É responsável pela elaboração dos recentes relatórios AidWatch, em Portugal. Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais pela Universidade Nova de Lisboa, é licenciada em Jornalismo pela Universidade de Coimbra.

No jazz, os fakebooks são uma espécie de guia básico da melodia e dos acordes de determinadas canções, a partir dos quais os músicos podem improvisar livremente. Foi a partir desta ideia que nasceu o primeiro fakebook, promovido pelo Observatório do Clima, a Greenpeace e a Climainfo, para desmascarar as notícias falsas mais frequentes, promovidas pelo governo de Jair Bolsonaro, no Brasil. Produzido na preparação da COP25, o documento viria a constituir-se como um “roteiro mínimo” para jornalistas, membros de organizações da sociedade civil e do governo que tivessem, nalgum momento, de lidar com o governo brasileiro e não tivessem à sua disposição informação prévia sobre a situação ambiental do país (1).

Desde então (2020), a Fakebook.ECO (www.fakebook.eco.br) tem desmontado diversos mitos com factos e informação credível e apostado na comunicação com o público sobre a situação real do país (nomeadamente, através de vídeos em português, mas também em inglês, a pensar num público internacional). Mitos como este – o Brasil é o país que mais preserva no mundo – combatem-se com factos – o Brasil é o país que mais desmata florestas tropicais no planeta. A ideia é mostrar ao país e ao mundo a verdadeira situação, sobretudo agora que está no poder um governo negacionista das alterações climáticas e que produz informação falsa (também) sobre o clima.

A situação é crítica, como demonstram os autores do Fakebook.ECO em inúmeros artigos: entre 1985 e 2020, o Brasil perdeu 85 milhões de hectares de vegetação nativa para exploração agropecuária. E só em 2021, o desmatamento foi 76% maior do que em 2018. É, por isso, necessário – e urgente – travar a acção deste governo, defende o editor da Fakebook.ECO, Felipe Werneck.

A Fakebook.ECO, que é uma extensão do trabalho levado a cabo pelo Observatório do Clima e o Agronitómetro, que já faziam verificação de notícias e de informações, prepara-se agora para a “enxurrada de mentiras durante a campanha eleitoral”, em duas frentes – verificação de factos e a desconstrução de mitos, e contam para isso com o apoio da Skeptical Science. Mas, adverte Felipe Werneck, há um desafio que é necessário ultrapassar – sair da “bolha” das pessoas já sensibilizadas para o tema, chegar às outras pessoas que apoiam a agenda negacionista em curso e habitam uma espécie de “submundo” na internet.

É, por isso, um dever moral continuar e reforçar este trabalho durante o período eleitoral que se avizinha, porque, nas palavras do editor da Fakebook.ECO, “para além do risco de perdemos a Amazónia, há o risco da ditadura”. Nos últimos três anos, o governo brasileiro foi “muito eficiente” na desregulamentação, mudança de lei e na retirada de órgãos regulatórios do terreno, uma situação que vai demorar vários anos a reverter, caso o panorama político mude.

“A Amazónia é uma situação de guerra”, diz Werneck, e citando o coordenador de Comunicação do Observatório do Clima, Cláudio Angelo, recorda que a desinformação é uma arma política e comporta-se como um lutador de Aikido: usa o método do jornalista para dar o golpe no jornalista.

Fakebook.eco

 

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(1) Pode ser consultado em https://www.fakebook.eco.br/wp-content/uploads/2020/06/the-ricardo-salles-fakebook_en-1.pdf