Universos desagregados: pensar identidades na dicotomização entre natureza e cultura

Flora Pereira da Silva

Doutoranda em Pós-Colonialismos e Cidadania Global, na Universidade de Coimbra, Mestre pela UNB em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação Internacional, e jornalista pela UFSC. É Diretora Internacional de Educação e Mobilização no Pulitzer Center, responsável por liderar programas de clima e florestas na América Latina, África e Ásia. Trabalhou na CLUA, PNUMA e foi diretora-fundadora do Afreaka.

Da euromodernidade à uma narrativa ambiental globalizada: dicotomização como forma de transformação do meio ambiente em recurso  

Na linha do tempo da biblioteca colonial, o olhar para o meio ambiente por parte das disciplinas sociais não foi preceito. Quando o tema não está invisibilizado, de modo geral, há a presença de uma forte lente dicotômica entre humanidade/meio ambiente e cultura/natureza. A própria palavra environment e environnement, ‘meio ambiente’ em inglês e francês respectivamente, evidencia a contraposição: significa aquilo que está no entorno, colocando a humanidade como centro e o restante como o espaço que o circunscreve. Estabelecida sobretudo pelas ideias universalistas da modernidade europeia, a separação que dá à natureza esse lugar do “outro” se constitui como uma ferramenta de hierarquização. O humano, como um ser não pertencente à natureza, estaria assim acima dela.

A natureza, em oposição à cultura, é convertida em um espaço vazio de pessoas e de ontologias a ser dominado e, por sua vez, convertido em um recurso natural que pode ser explorado até a exaustão. Essa linha divisória também abrange os povos que se colocam em pé́ de igualdade com a natureza, sugerindo que esses não “criam cultura” tampouco se organizam como civilização sendo assim taxados como “primitivos”, “selvagens”, ‘indígenas” e “bárbaros”. A modernidade europeia exclui a conexão entre homem e natureza, para assim poder se apropriar dos seus bens naturais e dominar os povos que os protegem. No quadro da criação do conceito de cultura, da invenção da própria natureza e da segregação do ambiente, a afirmação de identidade euromoderna deu o tom para o movimento de separação entre homem e seu meio.

As ciências sociais e humanas, inclusive a crítica pós-colonial, ainda estão longe de uma problematização ideal dessas questões e de suas implicações, sobretudo em relação ao entendimento ontológico da mudança climática que temos à frente, e as organizações e mecanismos internacionais de sustentabilidade tampouco – seguem reproduzindo e fortalecendo essa dicotomia. Analiso aqui tal processo de separação e dicotomização da euromodernidade como gatilho de formação de uma narrativa ambiental e climática globalizada, sobretudo no campo de desenvolvimento.

Biblioteca colonial: separação do meio ambiente e humanidade como ferramenta de hierarquização

“Natureza é talvez a palavra mais complexa da língua”, é assim que Raymond Williams, em seu livro Palavras-chave, um vocabulário de cultura e sociedade, começa a descrição sobre seu significado. A dicotomia aqui colocada em questão aparece já na definição inicial do termo: natureza seria a força inerente que dirige “o mundo ou os seres humanos ou ambos”; ou o próprio mundo material, “incluindo ou não os seres humanos” (1983: 219). O pertencimento do homem à natureza é explicitamente tensionado e o nosso pertencimento ao meio ambiente fica em aberto na definição.

As ciências sociais modernas herdam dos filósofos pós-platônicos e teólogos cristãos a ideia dos humanos fundamentalmente e qualitativamente separados e acima da natureza (Bone e Inglis, 2006: 275) e a modernidade europeia capitalista se funda na ode do poder da humanidade de controlar e subjugar a natureza questão. Herder (1784-91 apud Williams, 1983: 89) em sua obra Ideas on the Philosophy of the History of Mankind denuncia a noção de cultura pensada na Europa no século XVIII como “um insulto flagrante à majestade da Natureza”: cultura aliada à ideia de civilização seria uma abstração enganosa com a sugestão implícita de que há um processo de autodesenvolvimento histórico da sociedade de modo unilinear, cujo ponto alto e resultado final é a cultura europeia. Ao propor uma história universal e a noção hegemônica e homogeneizante de cultura em contraponto à natureza, os fins europeus eram para além da afirmação e criação dessa identidade soberana, o de subjugação e dominação dos quatro cantos do mundo.

Na história ambiental, meio ambiente é visto como um recurso e objeto de apropriação antrópica. Fazem parte dessa visão eurocêntrica tanto a concepção idílica e estetizante do mundo natural, apresentando-o como um lugar desprovido de saberes e de seres que o habitam de forma ativa e produtiva, quanto a concepção do rural como lugar secundário para o “desenvolvimento” (Ortega Santos e Olivieri, 2017: 32). Esse nivelamento entre homem e meio, ajudaria a justificar e intensificar, na narrativa Ocidental, as apropriações e violência da Modernidade e do Colonialismo. Ao separar o humano como um ser não pertencente à natureza, mas, sim, acima dela, com base na noção de civilização, dá-se origem às hierarquias entre as pessoas e os espaços no mundo e constrói-se um local inventado do ser superior, especial e civilizado da modernidade europeia. Cria-se a ideia do Outro, o que não ‘alcançou’ a linha de chegada da civilização – os seres inferiores que se colocam em pé́ de igualdade com a natureza ou por ela são “dominados”, e, por isso, aculturados e impotentes de se organizarem como civilização.

Este Outro, localizado no lado de lá da linha abissal, seria entendido como sub-humano, com pouco ou nenhum conhecimento valioso, não digno da noção europeia de cidadania e nem aos direitos individuais nela contidos. A separação das entidades cultura/sociedade e natureza/meio ambiente se trata de uma posição da Europa para o resto do mundo como uma contestação radical a outras epistemologias e ontologias, que enxergam uma única unidade dessas entidades. Uma metodologia latente para silenciar e subalternizar outras cosmologias, outros saberes e outras concepções de mundo (Meneses, 2020: 51-53).

Santos, Meneses e Nunes (2004: 26-29) ressaltam que a noção de natureza foi construída como algo exterior à sociedade, obedecendo às exigências de um sistema econômico mundial baseado na exploração intensiva dos bens naturais: “Se o selvagem é, por excelência, o lugar da inferioridade, a natureza é, por excelência, o lugar da exterioridade. Mas, como o que é exterior não pertence e o que não pertence não é reconhecido como igual, o lugar de exterioridade é também um lugar de inferioridade”. Dar à natureza esse lugar do Outro, do selvagem e do que deve ser domesticado, é um modo de legitimar sua objetificação, a transfigurando um espaço a ser possuído e indefinidamente explorado.

Universos desagregados: da dicotomia para a ideia de desenvolvimento sustentável

As mesmas contradições estão refletidas no campo da esfera da política ambiental. De um lado, a forte presença de uma biblioteca colonial ambiental como fonte primária de inspiração e, do outro, as axiomáticas mudanças climáticas e o começo de um entendimento global sobre a finitude dos “recursos naturais” em cima do qual a Modernidade se desenvolveu. A primeira guinada que veremos no discurso global político, apesar de não deixar de objetificar a natureza, a retira do lugar de indiferença e passividade. Quando o quebra-cabeça do desenvolvimento e de suas consequências na terra começou a ser montado, percebeu-se que os problemas enfrentados pelos países não eram peças desconexas. Começam a sair da marginalidade e são incorporadas aos fóruns internacionais as noções de sustentabilidade, que entram no debate de convenções como a Conferência da Biosfera da Unesco, em 1968, e a Conferência de Washington, de 1968, sobre os Aspectos Ecológicos do Desenvolvimento Internacional.

O conceito, hoje dominante na agenda internacional, de desenvolvimento sustentável, nasceu em 1972, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, conhecida como Conferência de Estocolmo, organizada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), que colocou pela primeira vez na agenda de todos os países-membros das Nações Unidas a questão ambiental. Apesar de o meio ambiente sempre ter sido essencial para a sobrevivência humana, foi nesse evento que as preocupações com um mundo e um estilo de vida mais sustentável ganharam dimensões internacionais – em outras palavras, começaram a fazer cócegas na máquina da Modernidade.

Em 1987, no lançamento do Relatório Brundtland: Nosso futuro comum, preparado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, se formalizou a ideia de desenvolvimento sustentável, definido como conceito sistêmico que incorpora os aspectos de um sistema de consumo em massa, mas no qual a preocupação com a natureza, via de extração de matéria-prima para suprir esse consumo, é máxima (CMMD, 1991). O conceito ganhou progressivamente mais força a partir de uma reunião da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), de 1986, que contribuiu para as bases do Relatório Brundtland (1987), na Conferência do Rio (1992), na Conferência de Kyoto (1997), na Conferência de Johanesburgo (2002) e na Rio+20 (2012).

Embora o meio ambiente seja trazido para o debate global nesse período, dentro da miríade do cardápio de conceitos socioambientais debatidos, o principal e mais aceito pelos Estados-nação contemporâneos, é o de “desenvolvimento sustentável”, que traz embutida a mesma dicotomia entre humanidade e natureza, enxergando-a como um recurso para o consumo de massa (mesmo que controlado). Ao não abrir mão da áxis do desenvolvimento, ignora que o sistema atual capitalista enfrentará os limites ecológicos do planeta para sua própria existência. O fato de que a principal agenda internacional de meio ambiente seja guiada pelo “desenvolvimento sustentável” escancara determinadas estruturas de dominação.

Usa-se o discurso socioambiental na indústria da cooperação internacional, assim como nas discussões sobre desenvolvimento, para validação de políticas e programas nascidos no Norte Global e para legitimação da presença de agências e organizações internacionais no Sul Global. Não são raros os projetos de estruturas de poder verticalizadas sem a participação dos chamados “beneficiários” – que só aprofundam a pobreza da população e colaboram com a destruição do meio ambiente. Nessa agenda global, o meio ambiente do Sul é tido como patrimônio global, que deve ser protegido por todos, lei que, no entanto, não é aplicada com o mesmo rigor quando se trata dos “recursos naturais” dos países do Norte.

O desenvolvimento sustentável, como conceito ambiental mais influente e afluente no discurso da globalização, prescreve e legitima uma ideologia, sendo mais um mecanismo de dominação intelectual e política do que um instrumento de redução da pobreza ou um projeto de sustentabilidade. Promove uma aliança entre movimentos ambientais e democráticos globais com o movimento neoliberal de livre mercado e é usado como referência para a alocação de fundos em projetos e programas de base e locais que sigam sua lógica, sobretudo aqueles frutos de tratados internacionais e de ajuda financeira bilateral e multilateral para projetos ambientais (Logan; Moseley, 2004; Logan, 2004).

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O meio ambiente do Sul é tido como patrimônio global, que deve ser protegido por todos, lei que, no entanto, não é aplicada com o mesmo rigor quando se trata dos ‘recursos naturais’ dos países do Norte.

Ao analisar a operação da noção de desenvolvimento sustentável para o continente africano, Logan (2004: 18) observa que essa ‘metanarrativa’ passa a dar o tom e comandar a lógica da práxis de políticas públicas nacionais, gestão de recursos, democratização, emancipação da comunidade, redução da pobreza e direitos humanos – sendo também o barômetro pela qual essas práticas serão julgadas. Disseminada por academia, mídia e instituições, se tornou um guarda-chuva das abordagens ambientais, no entanto, o discurso evita qualquer reflexão sobre políticas de poder e procurar analisar microssituações locais e regionais, desviando o olhar dos contextos internacionais e macropolíticos, e ignorando que as questões ambientais locais não existem como uma bolha, mas estão intimamente ligadas às economias políticas nacionais, regionais e globais. A prática não é diferente nos outros territórios do Sul Global.

Mesmo quando bem-intencionados, o autor argumenta que falta coragem aos programas e às políticas de desenvolvimento sustentável para endereçar na prática o cerne dos problemas, os quais estão, em teoria, destinados a combater. A desigualdade comercial, o desequilíbrio de poder político e a transferência homogeneizante de práticas e soluções continuam a ser realidades marginalizadas ou ignoradas. Isso faz com que tais programas, ao tentar implementar projetos de desenvolvimento sustentável e de combate à pobreza, sem refletir ou inferir sobre suas amarras macropolíticas, reforcem o sistema neoliberal ao qual estão vinculados e os problemas adjuntos a ele.

As práticas de políticas nacionais e internacionais ambientais não ficam isentas das mesmas fragilidades e ausências das disciplinas sociais. Um campo, na verdade, alimenta o outro, reproduzindo e reforçando a noção geminada que domina o pensamento Ocidental. O epistemicídio (Grosfoguel, 2016 e Santos 2010) das experiências que caminham em sentidos contrários a essa noção linear e o ignorar das epistemologias do Sul (Santos 2010) nas questões relacionadas à sustentabilidade continuam afetando e intensificando a agressão à natureza do Norte sobre o Sul, não apenas no contexto de mercado, como no próprio contexto da governança socioambiental – e acentuando a dicotomização que separa humanidade e natureza, assim como a violência e hierarquização por ela implicadas.

O desmembramento é político e, no cenário socioambiental internacional, reforça o poder dos cientistas, incluindo ambientalistas e ecologistas, sobretudo aqueles dentro da lógica ocidental, de falar pela Natureza, e deslegitima, silencia e ventriloquia os Outros, os chamados leigos, assim como as entidades não humanas (Latour, 2004). Os portadores de outras éticas ambientais são desvalorizados e seus métodos de conservação ignorados, em um contínuo processo violento de intervenção política e epistemológica: “‘fazedores de chuva’, os ‘herbalistas’, os ‘curandeiros tradicionais’, ou os ‘guardiões das florestas’ são substituídas pelos chamados especialistas, como ‘biólogos marinhos’, ‘climatologistas’, ‘botânicos’ etc.” (Chibvongodze apud Menezes, 2020: 63).

Há no Norte Global uma produção extensa de literatura sobre os problemas do Sul relativo às questões ambientais, que ecoa a biblioteca colonial, circunscrevendo a autonomia dos bens naturais, restringindo as alternativas ao desenvolvimento e minando soberanias nacionais (Logan e Moseley, 2004). Essa produção costuma reforçar três hipóteses: (i) crescimento populacional é a causa dos problemas ambientais; (ii) é impossível reduzir a pobreza sem controle de natalidade; e (iii) o combate da pobreza é o caminho para preservar o meio ambiente, mas a preservação do meio ambiente não é um meio de combate à pobreza.

Não é feita nenhuma distinção entre causas imediatas (que podem acabar abarcando pobreza e a fome) e causas basilares (desigualdades estruturais em nível global e local) da degradação e da insustentabilidade ambiental. Exemplos práticos de intervenções injustificadas, baseados nessa literatura, não faltam. Um caso emblemático foi a descoberta, após uma revisão literária detalhada, de que os dados usados como pretexto para projetos de intervenção internacional em Gana e Costa do Marfim, que previam o colapso ambiental dos países, não traziam evidências suficientes de que a região havia sofrido perdas florestais. Pelo contrário, mostravam a possibilidade de que a presença de aglomerados de árvores significava o avanço da floresta, plantada e preservada pela população local (Broch-Due, 2000). Os povos que estavam sendo acusados por sua degradação seriam na verdade os principais responsáveis pela proteção do meio e da terra, assim como de sua restauração.

Em outro caso, mais recente, vemos uma narrativa distorcida sobre a presença dos fogos em Angola ganhar escala e importância na agenda nacional, em 2019, no mesmo período em que as queimadas amazônicas se espalhavam pela mídia mundial. Uma imagem captada pela Agência Espacial dos Estados Unidos (Nasa) colocou Angola no foco, apontando 6.902 ocorrências de fogo em 48 horas, enquanto, no mesmo período, o Brasil registrou 2.127. As narrativas sobre os acontecimentos focaram na culpabilização rasa das populações rurais e mais pobres, sem qualquer avaliação do macro contexto das queimadas: não foram discutidas as importantes diferenças entre os biomas e a anormalidade ou não da presença de focos do fogo, não foi discutida a presença ascendente do agronegócio de larga escala no país, tampouco foi feita uma avaliação sistêmica da história política e ambiental da região.

Os exemplos substanciam a produção e reprodução de uma visão vaga e globalizante da natureza e da pobreza, assim como denunciam interpretações ocidentais dos problemas ecológicos, muitas vezes, amplamente desconectadas das realidades locais (Broch-Due, 2000). Baseiam-se ainda na falsa premissa de que a narrativa da sustentabilidade é imparcial, e uma “grande narrativa ambiental” segue existindo para que os conceitos não precisem ser problematizados, questionados ou adaptados à realidade divergente daquela de quem os criou. Na Academia e no mundo empírico onde essas ideias são reproduzidas e implementadas, implícita e explicitamente, impera uma noção global e imperialista de meio ambiente, que reforça, apenas de modo repaginado, as mesmas distorções e ausências do sistema binário colonial. Aliado a isso, a autoafirmação da identidade euromoderna complemente este ordenamento das práticas ecológicas contemporâneas. A linha de chegada do desenvolvimento sustentável, o modelo ambiental a ser seguido, as referências (práticas e literárias) de preservação e conservação: tudo está no Norte Global e para lá que os caminhos hegemônicos na agenda ambiental tentam “heroicamente levar o restante do mundo”. A biblioteca colonial ambiental, sustentada na desconexão entre natureza e cultura dá o tom para as disciplinas sociais e humanas e segue refletida na prática ambiental globalizada.

Concluo, no entanto, sugerindo que na contramão deste movimento secular, a dilatação da crise ambiental, exposta pelo desequilíbrio climático e suas consequências distópicas – tanto as previstas quanto as já em voga – tem pressionado os sistemas de governança e políticas públicas ambientais assim como os campos sociais e humanos a uma revisão das fronteiras entre a humanidade e o meio ambiente e das noções antagonistas de cultura e natureza. Neste contexto, avalia-se a possibilidade que, na iminência de um possível início do fim do mundo, o discurso ambiental e social dominante estejam vivendo uma espécie de ‘(re)conexão na crise’, sendo o desastre climático um estopim para o início de um movimento de afinidade e empatia entre universos historicamente desagregados e rivalizados.

Mesmo que de maneira tímida e ainda longe de uma problematização ideal, começam a surgir fraturas pontuais nas práticas acadêmicas ancoradas na Modernidade e no discurso ambiental hegemônico. A última década foi sintomática. Com as questões climáticas provocando reflexões ontológicas sobre a agência humana (Chakrabarty, 2012, Haraway, 2016 e Malm and Moore) e exacerbando como as estruturas históricas de poder provocaram e continuam provocando impactos ambientais diretos, a academia, ainda que em pequenos retalhos, tem começado a romper esse padrão de ausências ou de dualidade, procurando ressituar a relação cultura/natureza e humanidade/meio ambiente. Vemos movimentos como as humanidades ambientais, a ecologia política, e novas vertentes da antropologia ambiental ganhando força. Do Antropoceno à ecocrítica: é possível notar uma crescente necessidade de se revisitar e explicar a história, os estudos culturais, artes e literatura do ponto de vista ambiental. O que antes já existia, mas de modo granular, parece estar ganhando corpo e talvez procurando construir e fixar novas bases que sejam suficientemente maciças para o repensar das identidades e das narrativas ambientais contemporâneas.

 

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